domingo, 24 de julho de 2011

Uma Babá Nada Perfeita


PROGRAMAS SOBRE COMO EDUCAR OS FILHOS SEMPRE  
fazem muito sucesso com mulheres cujo instinto materno veio com defeito, mas, bem antes da moda das superbabás, outra megera com status de pedagoga comandava uma atração para orientar mães de primeira viagem - e com o estilo tipicamente medieval do início dos anos sessenta.

Bons Modos era apresentado por Adelaide Manière, uma senhora de meia-idade para quem a psicologia infantil deveria ser ministrada à base de CHOQUE ELÉTRICO. A atração, que era considerada normal pelo espírito da época, hoje talvez só fosse exibida (com cortes) na China.

Havia quadros de orientação vocacional (sobre como doutrinar crianças para escolher entre médico e advogado) e higiene pessoal - em que a apresentadora ensinava a lavar bem atrás das orelhas com o auxílio de uma escova de dentes. Para os moleques mais rebeldes, recomendava bombril. Mas o mais bizarro era o segmento de assistência jurídica, onde apontava os limites que os pais podiam atingir quando fossem punir seus filhos - para, por exemplo, evitar processos por lesão corporal.

Sobre essa matéria específica, Adelaide ensinava as mamães a adotar um sistema de punição e premiação. As punições variavam, de acordo com a indisciplina, entre a palmatória e alguns dias de retenção (com palmatória); a premiação era a ausência de punição. O método era vendido em uma apostila e tinha alguns pontos em comum com o Código de Hamurabi.

O PROGRAMA TERMINOU DEPOIS QUE UM MENINO ENGOLIU UM SABÃO, AO VIVO, DURANTE UMA DEMONSTRAÇÃO DE ADELAIDE SOBRE O QUE FAZER COM CRIANÇAS RESPONDONAS.



Texto: Arnaldo Branco
Fonte: Histórias (inventadas) da televisão, revista Monet nº186.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Bife Condenado




O gosto pelas plantas, desde a Antiguidade
Esta onda está crescendo. Seria o reinício de uma tradição milenar, como sugere a lista dos vegetarianos de ontem e de hoje, que você lê abaixo.

Zoroastro (628 a.C.-551 a.C.), religioso persa
Pitágoras (580 a.C.-500 a.C.), matemático grego
Sócrates (470 a.C.-399 a.C.), filósofo grego
Ovídio (43 a.C.-17 d.C.), poeta romano
Leonardo Da Vinci (1452-1519), pintor italiano
Isaac Newton (1643-1727), físico inglês
Voltaire (1694-1778), poeta francês
Arthur Schopenhauer (1788-1860), filósofo alemão
Charles Darwin (1809-1882), naturalista inglês
Franz Kafka (1883-1924), escritor tcheco
John Lennon (1940-1980), músico inglês
Linda McCartney (1941-1998), empresária inglesa
Brad Pitt (34 anos), ator
Brigitte Bardot (64 anos), atriz
Brooke Shields (33 anos),atriz
Claudia Schiffer (27 anos), modelo
Dustin Hoffman (62 anos), ator
Kim Basinger (45 anos), modelo
Martina Navratilova (43 anos), tenista
Paul McCartney (56 anos), músico
Richard Gere (49 anos), ator
Steve Jobs (43 anos), empresário
Sting (47 anos), cantor
Yoko Ono (65 anos), artista plástica


*P.s.: Levemos em consideração, por favor, que esta matéria foi publicada em 1998, gente!!!


Experiências recentes associam a carne vermelha a seis tipos de tumor. Três mil especialistas reunidos no Rio de Janeiro alertam para ter cuidado com ela.

por Denis Russo Burgierman, com Sônia Maia, de Londres

De acordo com o julgamento das maiores autoridades do planeta no combate ao câncer, só o cigarro pode ser mais perigoso do que uma picanha na brasa. Daqui para a frente, o rodízio e outros cultos da carne passam a ser o inimigo público número 2 segundo a bancada de juízes reunida no 17º Congresso Mundial do Câncer, em agosto, no Rio de Janeiro. Quem acha que essa é outra moda passageira vai mudar de idéia quando ficar sabendo que, segundo os médicos, 35% de todas as mortes por câncer se devem, em boa parte, ao abuso no consumo de filés, lombos e lingüiças.
Bye bye, fraldinha
“Quem come mais de 140 gramas por dia deveria pensar em reduzir a cota”, disse à SUPER o oncologista inglês John Cummings, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Ou seja, se você é um carnívoro moderado e só ingere, diariamente, o equivalente a dois hambúrgueres médios de qualquer modalidade de carne vermelha (o que inclui boi, porco e os outros mamíferos comestíveis),
é melhor cortar um deles já. E se você é daqueles que não passam 24 horas sem deglutir uma portentosa fraldinha grelhada, é melhor procurar um nutricionista e se submeter a uma reeducação alimentar geral.
Nos países ricos o trauma será menor porque boa parte da população já vinha empurrando o vermelho para fora da paleta alimentar. Agora, com o veredicto dos cancerologistas, o destino do bife mal passado, no mundo todo, é se tornar ator coadjuvante em cardápios cada vez mais dominados por plantas e por delicadas receitas à base de peixes e frangos.

Os venenos que a proteína esconde

A lista de doenças atribuídas ao bife não é apenas impressionante. Ela está crescendo. Para se ter uma idéia, até o início dos anos 90, a preocupação dos médicos concentrava-se nos males da gordura animal para o coração. Os fanáticos do espeto corriam alto risco de ataques cardíacos, hipertensão e aterosclerose. “Como a proteína vermelha tem muita gordura, ela aumenta as taxas de colesterol, um entupidor de artérias”, diz Bruno Debenois, diretor de Nutrição da Organização Mundial da Saúde.
Nesta década os médicos perceberam que também tinham que se preocupar com outra sinistra coleção de moléstias, a dos tumores malignos. Até 1990, apenas um câncerhavia sido relacionado ao açougue, o do intestino, o terceiro que mais mata no mundo. Mas, de lá para cá, apareceram os da boca, da faringe e do estômago, o campeão de mortes no Brasil. E, este ano, estudos preliminares estão revelando ataques a mais dois órgãos, o seio e a próstata. Segundo previsões do Instituto Nacional do Câncer, os tumores do estômago terão sido responsáveis

Não está claro, ainda, qual é o elo entre a proteína vermelha e a proliferação de células malignas nos órgãos da digestão, mas que ele existe, existe. Há cinco suspeitos. Um deles é a gordura. “Ela dificulta a digestão, forçando o fígado e o estômago a produzir ácido em excesso”, explicou à SUPER o oncologista suíço Fabio Levi, da Universidade de Lausanne. “E a corrosão das paredes do intestino pode provocar mutações cancerígenas”, afirma ele.




Abaixo o bem-passado
Outra hipótese é a de que o enxofre contido nos medalhões e escalopes possa estar participando de uma conspiração terrível, ao lado de uma infinidade de pequenas foras-da-lei. São as bactérias moradoras do intestino, denuncia o oncologista Cummings. “É quase certo que as toxinas expelidas pelas bactérias ao devorar o enxofre colaboraram para o aparecimento da doença.” No começo deste ano, Cummings fez uma experiência que confirma a hipótese (veja infográfico abaixo, à esquerda).
Outra substância perigosa contrabandeada para dentro do organismo é o chamado amino heterocíclico. Apesar de não existir nas proteínas cruas, ele é criado pelo calor da grelha ou da panela, formando aquele pretinho crocante dos churrascos e das frituras. “Os aminos acabam no interior das células, onde se ligam ao DNA e provocam mutações cancerígenas”, diz Barbara Pence, da Universidade Técnica do Texas, nos Estados Unidos. Ela demonstrou que, em altas doses, esses compostos chamuscados atacam o intestino e o estômago de ratos. O saborosos suspeitos foram também associados ao câncer do seio.

Quinteto de morte
As duas últimas substâncias incriminadas são o alcatrão, o mesmo do cigarro, contido na fumaça que sobe da picanha na brasa, e, pasmem, o sal que recobre a tradicional carne seca. Sozinho, ele é inofensivo. Mas, misturado a uma substância de nome arrevesado, o N-nitrosamida – segregado pela ligeira fermentação da carne ao sol – se transforma numa toxina cancerígena. Diante de um quinteto nefasto como esse, fica difícil ignorar os riscos da proteína vermelha.

Em 1981, o empresário Vital Zurita representava uma raridade no Brasil. Fundador do restaurante Sativa, em São Paulo, ele era um dos poucos a servir comida natural no país. Quase vinte anos mais tarde, segundo ele, a situação se inverteu. “Naquela época, era quase impossível pedir um prato que não tivesse proteína animal”, lembra. “Agora, a concorrência é grande e até as churrascarias têm mais opções de saladas do que de assados.”
Menos desperdício
As folhas, grãos, frutas e outros vegetais também ajudam a aumentar a diversidade protéica à mesa e ainda acrescentam ingredientes que nem sempre existem nos frigoríficos, como as vitaminas e os carboidratos (veja no quadro abaixo à esquerda). “Esses itens são essenciais para que as proteínas sejam absorvidas e bem utilizadas”, ensina a nutricionista brasileira Flora Spolidoro. Os carboidratos fornecem energia para montar as moléculas; as vitaminas e os minerais controlam as reações químicas, evitando desperdício de matéria-prima.
“O segredo da boa saúde é mesmo a variedade”, afirma o gastroenterelogista Dan Weitsberg, editor da Revista Brasileira de Nutrição Clínica. Consumindo de tudo um pouco, o corpo aproveita melhor o que entra. O oncologista Saxon Graham, da Universidade do Estado de Nova York, diz que dá para garantir a saúde mesmo consumindo carne todos os dias, desde que não faltem vegetais no menu. “Se ela eleva o risco de câncer”, argumenta ele, “as plantas, em compensação, reduzem o perigo.” Saxon lembra que não se sabe bem como a coisa funciona, mas o fato é que quem tem uma boa dieta verde conquista a capacidade de consertar danos feitos pela carne no DNA, antes que os estragos virem tumor. É, ao mesmo tempo, uma boa notícia e um argumento definitivo a favor de mais pluralidade na bandeja.



A solução é dizer não ao sofrimento animal (Que deveria falar mais alto por sinal, não?)


[Muito grão, gente! Grãos, grãos, grãos, santo grão! Ricos em proteína...)

Não é só uma frase de efeito. Aqui, como em muitos países, rola, mesmo, uma onda verde, que tende a afogar os adeptos da lingüiça em um mar de almeirão. Uma pesquisa feita em outubro pela revista americana Cancer mostra que houve um crescimento de 20% no consumo de vegetais, nos Estados Unidos, desde 1973. Não é à toa que a Burger King, a segunda maior cadeia de lanchonetes do mundo, resolveu fazer um teste e lançou, em 1996, um hambúrger de soja nos Estados Unidos. A empresa afirma que ainda não tem uma avaliação definitiva, mas considera que, até agora, o resultado tem sido “interessante”. (Neste caso, recomendo o hambúrguer de gérmen de trigo, pois a soja [leia aqui sobre a soja] também não é flor que se cheire!  Nossa Vida Verde...)
A força das hortaliças é ainda mais clara na Inglaterra, a meca mundial dos vegetarianos. Lá, mais de 5% da população já é adepta dessa religião alimentar. E, de acordo com um levantamento do Instituto Gallup, feito há dois anos, 46% dos ingleses estavam cortando a carne vermelha das refeições.
Fome de granola
Com essa fome de granola, não espanta que a Linda McCartney Foods, criada em 1991, tenha se tornado uma potência no ramo dos produtos veggies. A dona da empresa, ex-mulher do músico Paul McCartney, por triste ironia morreu em abril de câncer no seio. Mas a companhia viu seu faturamento crescer 800% em sete anos e já exporta para a Austrália e os Estados Unidos.
Não são apenas os vegetais que tendem a expulsar a proteína animal dos menus. A carne branca, representada pelo frango, também participa do movimento. Embora tenha uma quantidade um pouco menor de alguns minerais importantes, como zinco e ferro, é muito nutritiva e não tem tanta gordura quanto a dos bovinos. Além disso, não está sendo indiciada por causar doenças letais, como esta última.

“A redução no consumo da carne vermelha é mais acentuada nos países ricos”, explica o especialista em comércio internacional de alimentos Frank Fuller, da Universidade do Estado de Iowa, nos Estados Unidos. “Nesses países, existe uma busca crescente por cardápios mais saudáveis.” Já os pobres, que antes não tinham acesso à cara carne vermelha, estão se aproveitando da queda internacional dos preços. A carne bovina também ganha adeptos no Oriente, lembra Fuller. Os casos extremos, segundo ele, são o Japão e a Coréia do Sul. Na Coréia, o consumo mais do que dobrou em dez anos. Fuller suspeita que esses povos estejam, como retardatários, imitando o hábito ocidental de exagerar nos hambúrgueres e filés.
O que é grave. Segundo Cummings, o especialista de Cambridge, os cânceres do sistema digestivo, antes quase inexistentes, estão começando a aparecer com freqüência cada vez maior naqueles países. É sinal de que a troca de sua mesa tradicional, farta em peixes, pelo anacrônico modismo ocidental está custando caro. Não é bom negócio ignorar o julgamento dos médicos reunidos no Rio. Até que sejam apresentadas novas provas, fica valendo a sentença: o bife só pode se aproximar de seu prato de vez em quando.
Para saber mais
The Nutrition Desk Reference, Robert Garrison e Elizabeth Somer, Keats Pub, New Canaan, 1997.

The Vegetarian Life: How to Be a Veggie in a Meat-Eating World, Elizabeth Ferber, Berkley Pub Group, Berkley, 1998.

Na Internet: www.ganesa.com

Gases vigiados

Cientistas ingleses desmascaram um conluio de bactérias para criar células malignas.

1. Um voluntário fica numa sala lacrada, onde o ar entra e sai por tubos dotados de válvulas. Controlando o tubo de saída, sabe-se quais são os gases produzidos pelo sistema digestivo da cobaia.

2. Os cientistas dão ao cidadão uma dieta de carne vermelha, que contém enxofre e hidrogênio, e esperam, mais tarde, durante a checagem, encontrar este último entre os gases gerados na sala.

3. No final da experiência, entretanto, acham muito pouco hidrogênio e passam a desconfiar que ele poderia estar sendo consumido dentro do intestino do voluntário. Decidem procurar quem é o ladrão de gás.

4. Exames revelam bactérias chamadas dessulfovíbrio, capazes de combinar hidrogênio e enxofre para obter energia. Elas expelem um composto tóxico, o dióxido de enxofre, que é cancerígeno.

Trivial variado

Cada almoço e cada jantar devem oferecer uma boa diversidade.

Proteína
A matéria-prima do corpo. Com elas, você produz sangue e outras células. Ela está nas nas carnes, nos queijos, nos ovos... Mas também está presente em muitos vegetais, desde seja ingerida uma boa quantidade diária destes últimos.

Gordura
A grande vilã dos cardíacos não é de todo má. Sem ela, o corpo não absorve vitamina C. A recomendação é evitar excessos, especialmente a da pele de frango e da carne vermelha.

Energia
Os açúcares, encontrados nos doces e frutas, e os carboidratos, no milho, arroz e batatas,liberam nas células a energia que faz tudo funcionar. Três a cinco copos de cereais ao dia fornecem a quantidade de que você precisa.

Vitaminas e minerais
Fazem o corpo usar a comida sem desperdício. Frutas e verduras têm vitamina C; leite, cálcio; carne, vitamina B e ferro. A medida é três a cinco copos de folhas ou legumes picados.
Fibras
Duras demais, não são digeridas. Passam direto pelo intestino e varrem toda a sujeira. Estão em frutas, arroz, trigo, centeio, cevada. Você completa a cota com duas ou três maçãs ao dia.




sexta-feira, 1 de julho de 2011

Bisfenol A: Você é o que come na embalagem que consome?

"Da qualidade das embalagens comercializadas no Brasil"


Por meio do sistema endócrino, os agentes químicos interferem nos organismos e alteram a síntese e a metabolização dos hormônios. Ele é integrador, assim como o sistema nervoso autônomo, e é regulado por uma série de eixos de retroalimentação. Interferentes químicos ambientais alteram a produção de hormônios agindo como desreguladores endócrinos.
Para debater este assunto, a conselheira do Cremesp e endocrinologista 
Ieda Verreschi convidou o químico Peter Rembischevski – mestre em química orgânica e especialista em toxicologia, há 10 anos na Gerência Geral de Toxicologia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) –  e Fabiana Dupont, uma das criadoras do portal O Tao do Consumo (Você é o que come na embalagem que consome www.otaodoconsumo.com.br), com foco em informações sobre agentes químicos desreguladores como o Bisfenol A, presente em embalagens plásticas
para alimentos.
Ieda: A partir de 1980 surgiram pesquisas científicas sobre desreguladores endócrinos, indicando que provocavam alterações em algumas espécies sem maior repercussão. Recentemente, o assunto passou a ter maior destaque em conferências científicas.
Peter: O conhecimento científico nessa área cresceu muito nos últimos dois anos. Ensaios em animais e células humanas demonstraram que o bisfenol e outros desreguladores endócrinos têm potencial para causar efeitos adversos. A dúvida é se as doses empregadas nos estudos estão acima das que se correlacionam com a exposição humana. Mas, não podemos descartar os efeitos nocivos demonstrados em animais.
Fabiana: Pesquisas apontam que a maior fonte de exposição de crianças ao bisfenol é a mamadeira de policarbonato. Já a de adultos são as latas de alimentos e bebidas.
Peter: Estudos não comprovaram efeitos nocivos em baixíssimas doses. A Comunidade Europeia baniu recentemente a mamadeira de policarbonato, que contém bisfenol, baseada no princípio de precaução. Nesse caso é bem aplicado, pois não há certeza sobre sua segurança, há indícios de malefícios. Gosto da frase dos toxicologistas de que “a ausência de evidência não é o mesmo que evidência de ausência”. Comprovar que os níveis de bisfenol presentes em mamadeiras ou em enlatados não fazem mal ao ser humano seria evidência de ausência, mas não é esse o status atual.
Fabiana: É preciso mais pesquisas, inclusive sobre a interação entre vários compostos. Cerca de 80 mil químicos são utilizados no mundo em produtos do cotidiano. Apenas 200 foram estudados em profundidade, e a maioria como agente isolado. Os EUA declararam guerra ao câncer com foco nos químicos, porque os cientistas concluíram que a genética e os maus hábitos não são suficientes para justificar o aumento de câncer. Outra coisa pode estar acontecendo, o bisfenol age como um estrogênio e alguns deles causam câncer e infertilidade. O hormônio pode ser utilizado pela medicina para outros fins, mas sua inclusão em embalagens alimentares é um despropósito. O bisfenol também está presente em recibos de máquinas de cartão de crédito. Quem trabalha como caixa durante todo o dia precisa ser acompanhado, pois também o recebemos por absorção dérmica. Alguns desreguladores não afetam apenas a geração atual, mas as duas seguintes. Nossa geração conviveu menos com plástico, mas as crianças de hoje vivem em outro mundo. Quais serão as consequências em longo prazo?
Ieda: O princípio da precaução é importante. A evidência da atuação de ftalatos não é tão forte no animal exposto, mas os defeitos se manifestam nas gerações seguintes. Verifica-se em modelos animais pela possibilidade de analisar três gerações em três anos.

"Operadoras de caixa de supermercados apresentaram maiores níveis de bisfenol" - Peter
Peter: O artigo que a Fabiana citou sobre máquinas de cartões tem outras conclusões, como a análise de presença de bisfenol no sangue e urina de mulheres grávidas. As que trabalham como caixa apresentaram maior ní­vel de bisfenol, comparada às outras ocupações. Ainda que de forma cautelosa, sugere que a exposição ao bisfenol não acontece apenas por ingestão como pensávamos. É preciso estudar a exposição à pele.
Fabiana: Além de embalagens alimentares, o bisfenol é utilizado em CDs, DVDs, computadores, filtro de cigarro, papel filme etc. É um produto muito lucrativo para a indústria petroquímica, que pressiona para continuar a vendê-lo. Atualmente, cerca de seis empresas sintetizam o bisfenol utilizado no mundo. Nos EUA, várias empresas já estão procurando alternativas, utilizando resinas novas ou passando para o vidro. Como essa questão está sendo tratada pela Anvisa?
Peter: No imaginário popular, a substância sintética é ruim e a natural, boa. Há desreguladores endócrinos em produtos sintéticos e naturais, como a soja. Os alimentos liberam pesticidas naturais. As plantas que ingerimos produzem substâncias mutagênicas e até cancerígenas para se defender de agressores. Mas têm também substâncias benéficas que neutralizam essas ações, como por exemplo, os antioxidantes. O organismo tem uma memória toxicológica evolutiva pelo convívio com essas substâncias nos alimentos há milhares de anos, criando sistemas imunológicos e enzimáticos capazes de depurá-las. Talvez não seja possível fazer o mesmo com a sintética, que acompanha a humanidade há apenas 50 anos.
Fabiana: Do período da gestação aos três anos é a janela mais preocupante. A mamadeira já libera bisfenol na temperatura ambiente. Mas com o aquecimento, libera até 50 vezes mais.
Peter: A Universidade de Lisboa fez estudos em mamadeiras – com leite, suco de laranja e água em variadas temperaturas até os 100 graus – que demonstraram a migração do bisfenol A para o líquido. Fez-se também avaliação de risco, com base no valor de DDA (Dose Diária Aceitável) de 50 microgramas de bisfenol por quilo corporal. O máximo que se atingiu foi 1,7 – muito abaixo do DDA. Até há pouco tempo, isso sustentava sua não proibição. Porém, passou a ser proibido nos EUA e Europa porque estudos, ainda que não conclusivos, demonstraram alguns efeitos em doses 200 vezes mais baixas do que a aceitável. A Anvisa manteve aberta até fevereiro a Consulta Pública número 114 sobre centenas de aditivos de contato com alimentos, inclusive o bisfenol em mamadeiras. A consulta é motivada pela necessidade de alteração de parâmetros. A resolução da Anvisa estava defasada em relação aos avanços científicos e aos atuais parâmetros da Europa. Ela estabelecia em três miligramas por quilo a quantidade máxima de plástico em alimento, enquanto a Europa já adotava 0,6. Para harmonizar a legislação europeia com a de países do Mercosul, a norma será alterada.
 

"A maior fonte de exposição de crianças ao bisfenol é a mamadeira de policarbonato" - Fabiana
Fabiana: Em relação às mamadeiras produzidas, a Anvisa está checando a migração com os fabricantes?
Peter: Pode ser que não estejamos preparados ainda para essa migração das mamadeiras. A Europa fez isso e quando colocou o tema em consulta pública perguntou aos fabricantes o que a mudança acarretaria. A fábrica poderia fechar ou despedir milhares de pessoas? A agência reguladora e as autoridades devem ter essa preocupação. Quando não há certeza, querendo fazer o bem, podemos causar mal maior. Também é possível colocar uma substância menos testada e segura que a anterior no mercado. Bem ou mal, o bisfenol é testado há 70 anos. A conclusão do questionário aos fabricantes de mamadeira foi a de que a própria indústria já tinha substitutos.
Fabiana: Há pouco o bisfenol foi proibido na Europa. Já está proibido no Canadá e em oito condados dos Estados Unidos. A dúvida é: onde vão parar essas mamadeiras? É importante que o público seja informado sobre o que está acontecendo. Não é demonizar o bisfenol ou o plástico. Existem opções e mesmo no Brasil não é preciso se expor a isso.


Ieda:
 No controle das águas, a Sabesp está fazendo um trabalho específico e algo deve mudar, mas a Europa faz isso há séculos.

Peter:
 Há algum tempo está sendo revisada a Portaria 518, do Ministério da Saúde, de controle de água. A Anvisa entrou nessa discussão e acabou se retirando porque não concordava com os parâmetros adotados. Minha área gerencial desenvolve um programa de controle de resíduos agrotóxicos em alimentos que, no máximo até 2012, passará a fazê-lo em água também.
Ieda: A maioria dos agrotóxicos é desregulador endócrino.
Fabiana: Muitos falam que a água da torneira em São Paulo é boa para beber. Eu tomo às vezes, mas fico com medo.
Peter: É boa no sentido microbiológico e de controle do cloro, entre outras substâncias. Mas o controle químico ainda está pendente. A portaria 518 tenta estabelecer limites mais restritos para algumas substâncias, mas comparado aos EUA, estamos atrasados.
Ieda: A iniciativa privada tem um papel no sentido de antecipar catástrofes?
Fabiana: Oficialmente não, mas é fundamental que as empresas deem esse passo, sem esperar o governo proibir. A medicina e a ciência andam rápido e os processos governamentais são burocráticos e lentos. As empresas que tomarem a iniciativa primeiro sairão ganhando pela atitude sustentável de um produto livre de bisfenol. Além da mamadeira, são milhares de produtos plásticos utilizados, o copo descartável, as garrafas pet, Tupperware etc. Seu preço é muito baixo e, depois de usados, nada valem. A maior parte do que fica jogado na rua é de plástico. Além do volume enorme, a decomposição leva séculos e seus componentes podem se desprender e ir para os leitos fluviais. Latas ou vidros ao contrário, têm valor.

"O princípio da precaução é importante; os defeitos podem se manifestar nas gerações seguintes" -  Ieda  
Peter: Isso acontece naturalmente nos países em que a população está mais conscientizada.
Fabiana: Pode ser interessante a volta da reutilização do vidro, porque ainda há logística para tal. Bares trabalham com garrafas retornáveis, mas fazíamos isso também em supermercados com os refrigerantes e outras bebidas. Reutilizar reduz custos e permite o retorno ao ciclo produtivo em vez de ir para o lixo.
Ieda: Grande parte dos acidentes domésticos era causada por vidro quebrado ou estilhaçado. Houve um movimento da saúde pública para conter seu uso. O vidro pode retornar, desde que fabricado com outras características de segurança.
Peter: No caso de mamadeiras, por exemplo, há outros materiais plásticos isentos de bisfenol. Pode ser mais caro, feio e menos prático, mas a saúde das crianças merece esse cuidado. Chegará num ponto em que todos irão ganhar. Mas nem toda substância sintética é nociva. Bem ou mal, a humanidade progrediu e as condições de saúde melhoraram. Mas por que não evitar aquilo que não sabemos se faz mal? Os recipientes de plástico velhos, principalmente mamadeiras com rachaduras, liberam mais monóxidos. Está provado que cigarro tem efeito sobre o desenvolvimento fetal e seu filtro tem bisfenol. Pode haver sinergismo de substâncias. Às vezes, em pequena quantidade, não faz tanto mal isoladamente, mas, junto à outra, apresenta efeito aditivo. Está comprovado que essas substâncias cruzam a barreira placentária e atingem o feto, ainda despreparado para receber grande carga de substâncias químicas. Ainda em relação a essas substâncias, intriga a questão da feminilização em anfíbios.
Ieda: Vale lembrar que o órgão sexual de anfíbios desenvolve-se em uma ou outra direção de forma sazonal
Peter: O que foi observado em anfíbios pode não acontecer em mamíferos, mas é indício de que essas substâncias alteram a diferenciação genital. Uma pesquisadora da área comportamental fez um estudo com crianças de até quatro anos demonstrando que meninos que preferiam as brincadeiras de menina apresentavam maiores níveis de determinados ftalatos no organismo. É um indício intrigante que exige mais pesquisas.
Fabiana: Não é o produtor, mas a comunidade científica que tem de provar que determinado produto faz mal, quando deveria ser o contrário, principalmente quando está ligado à alimentação.
Ieda: Se compararmos com dez anos atrás, evoluímos, mas queremos melhorar mais.
Como saber se há bisfenol
Procure o símbolo da reciclagem na parte de trás da embalagem. O bisfenol pode estar presente nos números 3 e 7. Às vezes, a mamadeira não tem esse símbolo, mas em geral é mencionado de que material é feita. Evite se for de policarbonato.

Fonte: Revista "Ser Médico".